Mais do veneno<br>sobre as escolas portuguesas

Francisco Silva
Entrou por aí mais um ano lectivo. E os artigos dos jornais, e as imagens na televisão, e as palavras faladas na rádio, a aproveitarem a anual marcação na agenda de tal evento. Este ano com umas 1500 escolas a menos, um facto a simbolizar uma grande vitória dos diversos poderes - eles disseram da façanha conseguida: à conta da diminuição das despesas no sector da Educação, e praticamente só deste facto, começa a ser possível atingir o controlo de défice público. Quem diria que este sector, que gere a mais importante concentração de «cabeça-de-obra» de qualquer País - e então no nosso, upa, upa, já que, em geral, as empresas parecem não querer a qualificação dos recursos humanos utilizados (!?) -, dizia logo no sector dos professores, dos docentes, esta maravilha do corte nos gastos públicos a fazer figura laudatória máxima no cartaz. Agora se compreende melhor a persistência da diabolização do considerado inimigo público nº1 da nossa sociedade: os professores, aqueles que estarão a imbecilizar as novas gerações - é o que se ouve a toda a hora aos mesmos que pretendem que os professores sejam sobretudo disciplinadores, polícias, garantes da ordem pública no interior das escolas, e sobretudo passadores à Juventude do mecanismo do autoritarismo, garante de controlo dos rebanhos. Ao mesmo tempo, na televisão, a Sra. Ministra da Educação, respirando santidade, pouco mais ou menos assim, Não, não sou eu que descredibilizo os professores, não é da minha boca que o ouviste ou ouvireis jamais dizer, o que eu quero é que a sua posição seja a melhor, blá-blá, etc e tal. Poderia a correctíssima Sra. Ministra não dizer isto, dizer o contrário?
Entretanto, peguei num desses jornais que são distribuídos na rua. Dizem o mesmo que os outros e não custam dinheiro: basta-lhes o passarmos os olhos pela sua publicidade. E, mesmo sem esta, bastaria o serviço que prestado na construção e manutenção de visões do mundo adequadas - José Júdice que o diga -, justificaria o dispêndio correspondente com os mesmos órgãos de comunicação social. Mas, dizia eu, peguei num desses jornais e deram logo os meus olhos com um pequeno e pluralista artigo, disfarçado no canto inferior esquerdo de uma página par interior. Título: «Portugueses saem da escola cedo de mais» - ambíguo q.b. mesmo para leitores tidos como «informados», como é frequente nos títulos,. Subtítulo, tecnocraticamente frio: «Os currículos não favorecem o ensino de Português e Matemática». Zoom, um destaque, ainda mais tecnocraticamente frio, mais ambíguo e bem maldoso: «Só 25 por cento da população entre os 25 e os 64 anos terminou o ensino secundário e só 24 tem diploma». Por fim, acima do título do artigo, uma fotografia com uma sala de aula vazia legendada assim: «ESCOLAS PORTUGUESAS são as menos frequentadas dos países da OCDE». Tudo a condizer, pois claro.
A informação foi publicada - continuo a seguir o jornal Metro, já o leitor terá entendido - no relatório «Panorama da Educação de 2006» da OCDE que, como se sabe, inclui para além dos países «estrelas» do Ocidente, países, como o México e a Turquia, que o provincianismo elitista nacional considera estarem muitos pontos abaixo do estatuto desenvolvido e civilizado do nosso País. Mas que querem, aqueles países também são estrénuos aliados dos EUA… Ora adiante, para, não direi os pormenores, mas antes até interessantes detalhes incluídos no texto do artigo.
Portugal é o último da lista - o último mesmo - em termos de «tempo que a população passa nas escolas», dizem. Isto quer dizer que eles estão lá poucas horas por dia? Ou talvez porque os professores não querem trabalhar? - pergunto eu. Não, «a população adulta passou menos tempo a estudar», em média «menos três anos na escola» que nos outros países. No cimo da lista está a Noruega com uns 14 anos. Depois estão a Alemanha, a Dinamarca e os EUA, todos «acima» (sic) dos 13 anos - deve ser um pormenor informativo que tem a ver com médias... E, por fim, não dizem quantos anos estão os jovens portugueses nas escolas - ou se esqueceram de o escrever, ou não acharam importante informar o leitor sobre isso, ou pensaram que já devemos saber, ou ainda porque o valor é tão baixo (abaixo dos 9 nove anos obrigatórios) que não tiveram «lata» de o escrever. De qualquer modo, ficou a ideia de que, para tão pouca frequência, até deve haver escolas e professores a mais.
E viva a qualificação, incluindo a científica, dos «recursos» humanos portugueses!


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